quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Ode à TPM

.

(Mais conhecido como...)

A morte absoluta

Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.

Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão — felizes! — num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.

Morrer sem deixar porventura uma alma errante...
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?

Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.

Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: "Quem foi?..."

Morrer mais completamente ainda,
— Sem deixar sequer esse nome.

.

Manuel Bandeira

.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

I am Forrest, Forrest Gump!

Volta e meia, nessa minha vida besta pacata, passo por situações que me fazem sentir como uma personagem de algum livro ou filme. Não, não é bem isso, não me expressei bem. Não é que eu viva situações que me levam a pensar "hum... isso daria um filme/livro", não é isso. É uma coisa de momento. Sabe aquela expressão "tenho meus momentos"? Pois é... volta e meia eu tenho meus momentos cinematográficos e literários (às vezes os dois ao mesmo tempo, como você pode ver aqui).

Pois bem, ontem à noite eu estava em casa, meio sem sono, meio com preguiça de ir dormir (sim, eu tenho preguiça de ir dormir), meio pensando que eu já deveria estar dormindo, porque estava tarde e hoje ainda era dia de branco, quando minha preguiça foi interrompida por um clássico barulho de colisão de automóveis (batida de carro, para os leigos). Não foi nada muito estrondoso, não teve grandes freadas ou derrapagens (apesar do asfalto molhado); pelo barulho, eu diria que foi uma batida comedida porém vigorosa.

Fiquei feliz por ter arrumado a porta da sacada. Antes eu ia para a janela, mas não dava para ver nada além do muro do Peixinho e o semáforo da esquina; agora, da sacada, eu consegui ver um pedacinho de um carro atravessado no meio do cruzamento, parecia uma Kombi. O outro, um Peugeot 206 preto, na minha imaginação fértil (Celta, também preto, na cabeça da minha irmã, que nem estava acordada — nem acordou — na hora da batida), eu não vi, mas a Kombi deve tê-lo acertado em cheio do lado, ou lateral dianteira com lateral dianteira, porque foi uma pancada definitiva, sem cascalhos de ruído depois.

Como diria Mário de Andrade, "fez-se um silêncio de morte". Mas ninguém morreu, e acho que nem se machucou, pois, uns poucos segundos depois, o silêncio foi dissipado por uma menina totalmente descompensada se esgoelando no meio da noite, "Olha o que você fez no meu caaarroo!!! Você tá bêbado, seu desgraçadoo!!! Olha o que você fez no meu carrooooo!!!!". Ele devia estar mesmo bêbado, pois só dizia "Calma, não aconteceu nada, não fez nada no teu carro". Uma amiga veio logo em seguida, "Calma, Paula! Calma!". "Olha o que esse desgraçado fez no meu carro! Eu não vou ficar calma!". "Calma, Paula!". Mas a Paula não estava muito interessada em se acalmar, e continuou a gritaria.

Eu, mais que rápido, passei a mão no telefone e liguei para o 190 — e descobri que para o 190 o celular liga mesmo estando com o teclado bloqueado; depois soube que se você discar 911 ele te manda ligar no 190 (como se funcionasse!), não não fui eu que liguei, foi minha outra irmã — enfim, liguei para o 190 e acho que esse é o número de vezes que você tem que tentar antes de ser atendido. Como eu não estava com muita paciência, tentei só umas seis vezes e, como não deu certo, liguei pro 193 (Siate), mesmo achando que não tinha ninguém machucado (bom, não pelo acidente, mas como a Paula ainda estava descontrolada...), vai que eles têm uma linha direta com o pessoal do 190, né? Mas a moça disse que, como era "colisão de automóveis", eu tinha que ligar no 154, que é o Departamento de Trânsito. Lá fui eu acordar a mocinha do trânsito, ela não gostou muito e desligou na minha cara, só que como ainda não tinha ninguém conseguindo segurar a Paula para ela não matar o bebum da Kombi, liguei de novo (não sei de onde eu tiro tanta determinação às vezes, fico de cara!).

Esse foi meu momento Forrest Gump (já estava quase esquecendo que era esse o mote do post). É claro que essa referência só vai fazer algum sentido para alguém que tenha visto o filme umas 762 vezes... como eu! Engraçado... meus momentos cinematográficos são sempre sobre seqüências coadjuvantes, peripécias desimportantes, grandes feitos desprezados... com Amélie também foi assim...

É, minha vida não tem muitos momentos "que dariam um filme", mas um ou outro sempre acaba rendendo um post.